A Guarda e a Ucrânia

Desde há 12 dias que temos vivido em sobressalto. A Guerra voltou à Europa. O que nos parecia mais importante e fundamental, o que nos ocupava a cabeça e nos deixava ansiosos, foi subitamente relegado para segundo plano. O futebol, pináculo da exaltação (ou irritação?) nacional, parece gerar menos entusiasmo, emoção e picardias, quer sejam carinhosas ou mais cáusticas. A frase comum de que o futebol é “a coisa mais importante entre as coisas menos importantes da vida” faz aqui o seu teste do algodão. E com distinção, que atualmente há mesmo coisas mais importantes a acontecer. Outro assunto que sucumbiu à nova realidade foi a mediatização da pandemia – continuamos a ter medidas em vigor que procuram evitar a propagação do vírus, continuam a surgir novos casos, continuam a existir novos internamentos e continuam a existir mortes por causa do SARS-CoV-2 – mas a atenção dada a este problema pelos órgãos de comunicação social é substancialmente menor.

Por cá, decorreu no dia 25 de fevereiro mais uma sessão ordinária da Assembleia Municipal da Guarda que não teve, a meu ver e compreensivelmente, o mesmo impacto no espaço público de anteriores sessões. Um outro facto político, também secundário face ao que vivemos atualmente, mas ainda assim importante para o nosso concelho, parece também ter passado despercebido. A 4 de março, foi publicado em Diário de República o decreto-lei que atribui a gestão da Plataforma Rodoferroviária da Guarda à Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL), em mais um passo dado para a materialização do Porto Seco na nossa cidade.1

Apesar destas pequenas coisas que foram acontecendo e olhando em retrospetiva, após dias em que temos visto e revisto a destruição indiscriminada de um país e o profundo sofrimento atroz infligido a um povo, parece que uma vida inteira passou entre o dia dessa mesma Assembleia Municipal e o dia em que escrevo estra crónica.

Mas, no entretanto, a Guarda não esteve parada. E, em tempos sombrios e angustiantes, é importante estar solidário com o sofrimento humano, defender os que partilham os nossos valores comuns e agir em prol dos que precisam de ajuda.

Por isso mesmo, no dia da própria Assembleia Municipal, houve um momento de solidariedade e união dos presentes para com a situação vivida na Ucrânia.

Da sociedade civil, promovido por elementos da comunidade ucraniana da nossa cidade, surgiu uma recolha de roupas, alimentos e outros bens que durante a semana passada seguiram para quem mais necessita. Nos últimos dias, várias outras iniciativas solidárias de compra e recolha de bens em falta foram surgindo.

No dia 1 de março, organizada pelo proativo e conhecido Grupo de Emergência da Guarda, decorreu na Praça Luís de Camões (Praça Velha) uma vigília pela paz na Ucrânia. Entretanto, um grupo também no Facebook denominado “Guarda pela Ucrânia” foi criado em virtude da situação que todos acompanhamos.

Em termos de instituições, O Município da Guarda, desde o eclodir da invasão russa, tem agido de forma célere e efetiva. Criou o Gabinete de Crise Para Apoio aos Refugiados Ucranianos, que de forma articulada com entidades do concelho garantiu capacidade para receber 125 pessoas – número que pode aumentar – através da Pousada da Juventude e espaços pertencentes à Diocese da Guarda. Para além disso, o IPG demonstrou disponibilidade para receber estudantes ucranianos, a ULS da Guarda pode receber quem necessite de cuidados e o NERGA está já no terreno para aferir oportunidades de emprego – à data em que escrevo este artigo (07/03/2022) e segundo uma notícia da Rádio F, já haveria 200 potenciais postos de trabalho.

Para além disso, no dia 5 de março, o Município da Guarda enviou um autocarro com uma equipa constituída por dois tradutores, um médico e uma enfermeira rumo a Varsóvia, capital da Polónia, com dois propósitos. Por um lado, trazer 47 refugiados de guerra ucranianos para a Guarda. Por outro, levar mais bens essenciais como cobertores e produtos de farmácia e higiene para quem foi deslocado por este drama e ficou praticamente sem nada.

Vivemos tempos diferentes, enquanto continuamos a viver a nossa vida de sempre. A Guarda tem agido em função destes dias extraordinários, enquanto continua a construir o seu futuro. Que continuemos assim.

1 https://dre.pt/dre/detalhe/decreto-lei/24-2022-179993083

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