Grupos de interesse
Foi publicado no mês que em breve finda o trabalho “Os grupos de interesse no sistema político português”. É mais um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Longo e de índole académica, logo menos chamativo para as labaredas fugazes do dia-a-dia mediático, é uma publicação que nos ajuda a compreender o cosmos da ação de grupos organizados no nosso país e como podem influenciar, positiva ou negativamente, as decisões que nos afetam a todos.
Fiquei curioso, logo à partida, com o que são “grupos de interesses”. Segundo a publicação, são “organizações formais, normalmente baseadas numa adesão voluntária, que procuram influenciar em seu favor as políticas públicas sem assumir responsabilidade de governo.” Portanto, a minha ideia inicial, de grupos opacos e pouco transparentes cai logo por terra. Nas conclusões percebe-se que um dos objetivos desta publicação acaba por ser essa mesma, desmistificar o que são grupos de interesse. Na verdade, desde as Ordens Profissionais aos sindicatos, passando pela associação de bairro que pugna por mais espaços verdes, todos são grupos de interesses. Por esta curta enumeração, intui-se que cabem aqui muitas estruturas, de variadíssima dimensão em termos de recursos e associados.
As 203 páginas impedem uma apreciação global, sobretudo numa publicação tipo artigo/crónica. Todavia, as conclusões apontam alguns aspetos relevantes e que salientarei de ora em diante.
Estes grupos de interesse, não sendo eleitos, contribuem para a produção legislativa em Portugal (ou seja, procuram influenciar aquilo que o governo e a Assembleia da República legislam) e refletem as divisões e conflitos da sociedade.
A visão da população sobre os mesmos é bastante variável, sendo que os portugueses têm um reduzido nível de confiança em alguns, nomeadamente entidades religiosas, sindicatos e associações profissionais. Perceber porquê pode ser um exercício útil, até porque o próprio Governo certamente se serve do grau de aceitação de cada grupo ao lidar com as respetivas reivindicações.
Globalmente, em comparação com outros países europeus, a participação dos portugueses em associações da sociedade civil é baixa. Ainda assim, tem aumentado nos últimos anos, quer em número, quer na pluralidade de âmbitos e causas defendidas.
Outra conclusão interessante prende-se com a avaliação não positiva, pela população, da ação destes grupos na melhoria da representação política, apontando-se como fator preponderante a lógica fechada destas organizações. Num breve parêntesis, podemos empiricamente verificar esta conclusão no resultado eleitoral autárquico do nosso município em setembro de 2021. As cúpulas partidárias não discerniram corretamente perfis de candidatos ou propostas, pelo menos não de acordo com os anseios e necessidades da população. Este desalinhamento abriu caminho a um novo tipo de participação bem-sucedida e o resto é história a escrever-se. E nessa história a escrever-se, o sucesso foi transfigurado em associação cívica recentemente fundada e anunciada. Aí, deve manter-se o mesmo trilho – para o qual pode a leitura desde trabalho ser útil – e evitar-se a repetição de erros de outros no passado que foram também eles catalisadores do próprio sucesso deste movimento.
Regressando ao trabalho em si, é consensual que a ação destes grupos se faz em dois campos: o parlamentar – procurando influenciar as leis decididas na Assembleia da República – e o mediático – através da consciencialização da opinião pública para as causas e reivindicações de determinado grupo. Os grupos de interesse têm um acesso assimétrico a estes meios, pois grupos maiores e com mais presença na comunicação social e redes sociais terão mais sucesso do que outros. No fundo, podemos dizer que serão quase sempre os mesmos a estar representados e a ter voz no Parlamento. Ainda assim, as redes sociais, as petições públicas (sobretudo eletrónicas) e os diversos meios de comunicação social geram espaços de expressão de outros interesses. Nesta linha, e apesar do trabalho ser sobretudo de âmbito nacional, também na Guarda temos órgãos de comunicação social e uma Assembleia – a Assembleia Municipal – como plataformas de expressão e decisão de causas e reivindicações. Se considera que algo deve ser diferente, porque não ser um grupo (ou individuo de interesse) e tentar mudar algo?
Link para a publicação: https://www.ffms.pt/publicacoes/grupo-estudos/6438/os-grupos-de-interesse-no-sistema-politico-portugues